A crise é evidente: em Portugal são poucas ou quase nenhumas as plataformas — revistas ou jornais — de crítica, investigação e discussão, dedicadas à arquitectura. O fim da instituição da crítica de arquitectura tornou-se um facto consumado, mas este é apenas o sintoma mais evidente da consolidação de uma prática profissional — mas também académica — sem disciplina: sem história, sem teoria, sem projecto.
A afirmação absoluta do modelo de mercado neoliberal sobre o conjunto da prática profissional da arquitectura esvaziou de sentido a possibilidade de um saber disciplinar da arquitectura: o fazer saber próprio de uma arquitectura fundada na instituição — ou na expectativa da instituição — de um mundo público e colectivo foi substituída por um mero saber fazer ou, melhor, um know how instrumental e puramente técnico ligado ao mercado imediato da encomenda privada. Tal como a cidade deixou de ser um bem público, para passar a ser apenas um «activo financeiro» privado, também a arquitectura deixou de o ser.
É precisamente porque a arquitectura foi privatizada, porque esta deixou de corresponder à necessidade de pertencer e de se legitimar na ordem de um sentido público comum e partilhável, que a crítica, que a história, que a teoria, em suma, que a ideia de «projecto», passou a ser pouco mais do que um souvenir ou, no pior dos casos, um fetiche. Por outro lado, a afirmação desse modelo neoliberal sobre a prática académica não retirou apenas autonomia, mas esvaziou as suas competências críticas e legitimadoras: a hipótese de fazer escola parece, hoje, uma quimera tão distante como fazer crítica.
É, portanto, nesta articulação arquitectura-crítica-investigação-escola que se coloca a possibilidade de um jornal capaz de re-animar os vínculos entre uma prática académica e uma prática profissional, fomentando acesso ao estudo da (e sobre a) arquitectura, à leitura crítica das suas obras e discursos, mas também a uma análise da própria condição e estatuto da arquitectura numa época em que as condições políticas, económicas e sociais, da sua produção e da sua reprodução dentro do capitalismo neoliberal estão em permanente transformação e crise.
Isto significa que a vocação deste jornal visa interpelar a arquitectura na sua condição presente e nos problemas que a confrontam, mas apenas na medida em que estes problemas e essa condição são, também eles, de natureza histórica. Assim, a disciplina e os seus objectos não são um fetiche nas mãos de um coleccionador entretido no seu «jardim do saber», mas são fragmentos e estilhaços que reflectem na sua própria superfície o rosto impreciso do presente. E, por isso, nenhum objecto é apenas arquitectónico. Como escreve Jacques Rancière, uma disciplina é sempre «um reagrupamento provisório, uma territorialização provisória, de matérias e questões que não têm por si mesmos uma localização ou um domínio próprio».
Arquitectura
:
Teoria & História
Obra
:
Projecto & Profissão
Capital
:
Metafísica & Território
Política
:
Cidade & Comum
Terra
:
Co-existência & Forma-de-Vida
Escola
:
Disciplina & Vocação
Estes são os operadores funcionais que organizam a constelação temática deste jornal
Stones against diamdonds
Stones against diamonds é um projecto editorial ligado ao grupo de investigação ATPH [Arquitectura: Teoria, Projecto, História] do Centro de Estudos de Arquitectura e Urbanismo da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto. O nome convoca o texto de Lina Bo Bardi «Pedras contra brilhantes» e retoma um projecto com o mesmo nome iniciado no ano de 2017 e interrompido no curso da pandemia da Covid-19. Durante este período e com o título «ex-curso: textos à margem, desvios, derivas, experimentos» foram publicados textos de Giorgio Agamben, Pedro Levi Bismarck, Nuno Teotónio Pereira, Manfredo Tafuri, Manuel Mendes, Pier Vittorio Aureli, Anne Lacaton & Jean-Philippe Vassal.
Equipa
Pedro Levi Bismarck Ana Catarina Costa João PaupérioContributos
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Apoio
Centro de Estudos de Arquitetura e Urbanismo (CEAU) da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP), com o apoio da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).

